PARTE 1 - A construção dos sentidos por meio do estudo crítico das metafunções produzidas pela campanha publicitária “Todo mundo tem um lado devassa”

 

INTRODUÇÃO

A presente pesquisa tem o objetivo de proceder a análise crítica do texto multimodal de um videoclipe da campanha de divulgação da cerveja Devassa (2º COMERCIAL, 2011), protagonizado pela cantora Sandy Leah.

Percebe-se que, em meio ao surgimento de mutações do processo de comunicação em massa, atenuado pelo uso das novas tecnologias, é necessário cada vez mais o engajamento dos alunos e a aplicabilidade de novas teorias nos ambientes escolares.

Dessa maneira, o letramento multimodal surge com a finalidade de ajudar o aluno no desenvolvimento de novas competências leitoras, não só do texto impresso, todavia do texto digital em tela. Diante disso, a reformulação do currículo escolar possibilita uma evolução no sistema de ensino, tornando seus aprendentes leitores proficientes e críticos de textos de todas as esferas comunicativas, mesmo diante da diversidade de modais semióticos em sua tessitura.  

Em obediência à finalidade deste post, não será traçada exaustivamente uma fundamentação teórica, entretanto gostaríamos de delinear as metafunções encontradas na obra de Lim-Fei e Yin (2017), a fim de associá-las às metafunções indeacional, interpessoal e textual elencadas por Halliday (1994) em sua Gramática Sistêmico-Funcional (GSF).      

É notório observar que, a campanha publicitária foco desta análise adotou a cantora Sandy como sua garota-propaganda, em virtude da sua imagem aproximar o público feminino para o consumo da bebida. Logo, é comum marcas como a Devassa incluírem artistas famosos no seu rol de divulgações, a fim de incentivar, por meio de chamamentos tendenciosos, como “Todo mundo tem um lado devassa”, o consumidor para mudanças de hábitos, neste caso pela quebra da imagem da cantora, atitude que causou certa repercussão midiática à época.

Desse modo, este estudo analisará criticamente o texto multimodal presente no 2º videoclipe da campanha publicitária “Todo mundo tem um lado devassa”, da cerveja de marca Devassa, a qual veio ao ar no dia 1º de março de 2011, com veiculação por 15 dias em TV aberta. Além disso, pretende-se, de forma ousada, aplicar as estratégias de análise crítica multimodal do texto publicitário elencadas na metodologia, em uma turma do 3º ano do ensino médio.     


FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

 

É indiscutível que, por meio da linguística defendida por Halliday (1994) sobre a linguagem verbal (o autor era ciente sobre a parte verbal constituir um dos diversos modos semióticos), vários outros teóricos surgiram com o objetivo de investigar outros modos como a imagem, elaborando teorias cujo foco era alicerçado em uma semântica da linguagem.


Nesse sentido, foi com base na sistematização hallidiana que O’Toole (1994), Lemke (1998), Kress e van Leeuwen (2006) e Lim-Fei e Yin (2017) desenvolveram suas metodologias de análise da imagem, as quais servem como suporte para várias metodologias de identificação do texto multimodal.


Assim, várias perspectivas de análise foram criadas ao longo dos anos e nomeadas conforme seu grupo de taxonomias idênticas. Dessarte, três abordagens são mais recorrentes nos estudos multimodais, a saber:

Tabela 1 – Abordagens dos estudos multimodais

Dentre as abordagens mencionada, é na sociossemiótica multimodal a base conceitual de Halliday para análise do texto verbal. Nesse viés, a linguagem é vista como um recurso de trocas de significados, modo de agir, de solicitação de bens e serviço e de informações, em que o indivíduo é capaz de desempenhar funções ou papéis sociais atuantes (FUZER; CABRAL, 2014). A materialização dessa visão de linguagem é evidente nos estudos de Halliday (1994), através de três metafunções: a ideacional, a interpessoal e a textual.

Vejamos a representatividade das metafunções no estrato léxico-gramatical:

Figura 1 – As metafunções e o sistema léxico-gramatical

                 Fonte: Adaptado de Fuzer e Cabral (2014, p. 33).


No estrato semântico ideacional, a oração (unidade de análise) é vista como uma representação da realidade, desempenhando funções distintivas no mundo, a experiencial e a lógica de um sistema de transitividade (FUZER; CABRAL, 2014).


Na perspectiva da metafunção interpessoal, a oração é vista como interação, em que o foco na análise se encontra no sistema de modo, ou seja, os recursos gramaticais são utilizados para a expressão da interação, quais sejam: sujeito, finito (verbo), complemento, predicador ou adjunto (FUZER; CABRAL, 2014).


Já na metafunção textual, a oração é interpretada como mensagem, acompanhada de uma estrutura temática: (1) tema (elemento ponto de partida da mensagem) e (2) rema (elemento novo incorporado ao tema e com grau máximo de dinamismo e forma) (FUZER; CABRAL, 2014).

Associado aos estudos funcionalistas de Halliday, Lim-Fei   e Yin (2017) dividem suas taxonomias para compreensão dos textos visuais em mensagem, envolvimento e forma


São nas modalidades mensagem e envolvimento que encontramos 4 metafunções que serão classificadas a seguir:

Figura 2  - Metafunções em Lim-Fei e Yin

                   Fonte: Adaptado de Lim-Fei e Yin (2017).

(CLIQUE AQUI PARA VISUALIZAR A SEÇÃO DE ANÁLISES)


Neste estudo, a noção de canção popular massiva será de grande valia para subsidiar a análise dos aspectos sonoros do videoclipe, uma vez que ela “está ligada aos encontros entre a cultura popular e os artefatos mediáticos, entendendo que tal trajeto histórico parte da canção popular e chega até a sua configuração enquanto produto massivo” (JANOTTI JR, 2005, p. 5 apud SOARES, 2006, p. 1).


Percebe-se que, o produto massivo é aquele transmitido para construção dos sentidos e se apresenta na significância, por meio da inclusão dos modais semióticos, sendo desenvolvido na escuta do objeto empírico e dividido em modos de escuta. Segundo Chion (1994), são três os modos de escuta: causal, semântica e reduzida (CHION, 1994 apud JANOTTI JR, 2005, p. 4).


Nesse viés, a escuta causal terá relevância para as análises, devido à necessidade de o aluno ter que ir em busca da fonte da música produzida no videoclipe, não obstante a escuta semântica, como interpretação do código sonoro e da letra da música, recebe importância basilar, visto que no videoclipe, o analista deve desenvolver a escuta semântica para estar atento às configurações de como a letra é cantada e como a mensagem é codificada. Já a importância da escuta reduzida é gerada pela problematização da relação estética entre som e imagem, não tendo, obrigatoriamente, uma relação de sinestesia (JANOTTI JR, 2005).   


METODOLOGIA

 

O vídeoclipe da propaganda publicitária da cerveja Devassa será analisado em uma perspectiva de análise do discurso multimodal (Multimodal Discourse Analysis), representada por O’Halloran (2004) e O’Toole (1994) e traduzida em estratégias de sala de aula, com o fito de desenvolver uma abordagem para o ensino de textos visuais voltados para alunos do 3º ano do ensino médio. Na perspectiva de Lim-Fei e Yin (2017), o anagrama FAMILY Framework corresponde aos resultados da abordagem Systemic-Functional Multimodal Discourse Analysis (SFMDA), a qual traz representações mais acessíveis e com estudos baseados no triângulo persuasivo de Aristóteles.  

Para isso, é necessário que o professor tenha o conhecimento a respeito das metafunções elencadas por Lim-Fei e Yin (2017) em suas taxonomias, tendo em vista que o estudo será feito em conformidade com as categorias de análise elencadas na fundamentação teórica deste trabalho, cujo foco recai sobre estas modalidades: mensagem, envolvimento e forma (divididas em três postagens complementares neste texto).

Além disso, a noção de canção popular massiva de Janotti Jr (2005 apud SOARES, 2006) norteará a pesquisa na análise inicial do material sonoro, a fim de subsidiar um debate inicial em sala de aula, uma vez que ao invés de o professor iniciar interrogando os envolvidos na pesquisa sobre o videoclipe, a partir de suas imagens, ele pode principiar as análises indagando os alunos sobre seus conhecimentos dos sons do clipe (arranjos da canção, voz, instrumental utilizado, efeitos de produção, contexto histórico envolvido etc.), problematizando-o de forma a associar o som à imagem e, posteriormente, solicitar os aspectos que envolvem o letramento visual.

Nesse sentido, para análise sonora, a estrutura desenvolvida pelo Into Film (3Cs e 3Ss) será utilizada na discussão de análises da relação som e imagens, pois como plano de fundo ouve-se a música “Conga, conga, conga”, sendo primordial esse tipo de análise para a produção de significados do vídeoclipe nos alunos.

Vejamos os questionamentos para a discussão da parte sonora:

1.    Quantos sons diferentes você ouve? Quais são eles?

2.    Qual o tipo de sentimento você sente ao ouvir a música?

3.    Há algum momento de silêncio no vídeo?

4.    Quais os efeitos sonoros perceptíveis no vídeo?

Os procedimentos em sala de aula serão norteados pelos seguintes passos: (1) audição da música ”Conga, conga, conga” de Gretchen e simultânea tradução da letra, buscando o seu significado, (2) Apresentação do videoclipe do anúncio publicitário da cerveja Devassa, protagonizado pela cantora Sandy, (3) Audição das análises feitas pelos alunos da classe, em resposta às perguntas semiestruturadas produzidas pelo professor e (4) Análise e comentários do professor, com o foco na produção crítica das problemáticas sociais reproduzidas no videoclipe (VER A SEÇÃO DE ANÁLISES).

Para cumprimento do passo (3), as perguntas semiestruturadas serão feitas oralmente pelo professor, durante a exposição dos recortes das imagens analisadas por ele, o qual deve reservar tempo para que os alunos consigam projetar suas análises às respostas solicitadas, e associá-las aos conhecimentos adquiridos durante os passos (1) e (2). Essas perguntas devem estar em conformidade com a Canadian Common Curriculum Framework, com o foco na quinta habilidade, a visualização.

Vejamos os questionamentos para a discussão do passo (3):

1.    O que o vídeo está representando?

2.    Como esse tipo de vídeo é construído?

3. Quais suposições, interesses, crenças, preconceitos e valores sociais são retratados no vídeo?

3.    Qual o propósito do vídeo?

4.     A quem ele é dirigido? Quem ele exclui?

5.    Qual a foi sua reação ao ver o vídeo? O que causou essa reação?

6.    Que conexões e associações pessoais podes fazer com este vídeo?  

Finalizando o trabalho, e inferindo sobre os aspectos críticos do texto multimodal, o professor tece seus comentários em conformidade com as metafunções elencadas por Lim-Fei e Yin (2017), evidenciando os aspectos sistemáticos da mensagem, envolvimento e forma


REFERÊNCIAS

FUZER, C.; CABRAL, S. R. S. Introdução à gramática sistêmica funcional em língua portuguesa. Campinas: Mercado de Letras, 2014.

HALLIDAY, M. A. K. An introduction to functional grammar. London: Edward Arnold, 1994.

KRESS, G.; VAN LEEUWEN, T. Reading images: the grammar of visual design. 2. ed. London: Routledge, 2006.

LEMKE, J. L. Multiplying meaning: visual and verbal semiotics in scientific text. In:

LIM-FEI, Victor ; YIN, Serene Tan Kok. Multimodal translational research: teaching visual texts. In: SEIZOV, Ognyan; WILDFEUER, Janina (ed.). New studies in multimodality: conceptual and methodological elaborations. London: Bloomsbury, 2017. p. 175-19.

MARTIN, J. R.; VEEL, R. (ed.). Reading Science. London: Routledge. 1998. p. 87-113.

O’HALLORAN, K. L.  Visual semiosis in films. In: O’ HALLORAN, K. L. (ed.). Multimodal discourse analysis: systemic functional perspective. London: [s. n.], 2004.

O’TOOLE, M. The language of displayed art. London: Leicester Univesity, 1994.

SOARES, T. Por uma metodologia de análise mediática dos videoclipes: contribuições da semiótica da canção e dos estudos culturais. UNIrevista. Brasília, v. 1, n. 3, jul. 2006. Disponível em: http://www.midiaemusica.ufba.br/arquivos/artigos/SOARES1.pdf. Acesso em: 27 jun. 2021.

2° COMERCIAL Cerveja Devassa. [S.I.]: Cervejaria Schincariol, 2011, 1 vídeo, son., color. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=WtgqwT3utX4. Acesso em: 29 jun. 2021.

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